REGRAS DO DEBATE E REGRAS DA
ARGUMENTAÇÃO
Segundo Marc Angenot podemos distinguir entre regras do debate e
regras da argumentação. Ambas constituem condições de possibilidade das
argumentações. As regras do debate fixam as «condições
processuais 
requeridas aos interlocutores para que aceitem debater, condições que são
concebidas como indispensáveis, ou seja, fora das quais não pode haver
senão frustração recíproca e falhanço da discussão» (Angenot, 2008: 133).
Estas regras têm várias dimensões, indo da regulação dos turnos de
palavra à seleção do tema a debater e às formas éticas de interagir.
Podemos enumerar, como regras do debate, as seguintes (cf. Angenot:
2008, 136 e ss):
1) Reconhecimento da igualdade dos participantes.
2) Acordo sobre a «existência» do tema.
3) Uma diferença quanto às posições dos participantes.
4) A disposição para argumentar.
5) Disponibilidade para mudar de opinião.
6) Interdição de sair do argumentativo.
7) Privilegiar a exigência dos participantes.
8) Regras práticas que visam evitar a queda na esterilidade da regressão
ao infinito, em querelas semânticas ou em obstáculos que impedem a
fluência da comunicação e a expressão prática de posições.
9) Regras relativas à conclusão do debate (uma vez que há que não
permanecer nele indefinidamente).
No entanto, como observa também Angenot, nada nestas regras é
simples: «como uma ilusão que as auréola, flutua sobre estas normas
simultaneamente imperativas e indecisas, uma espécie de ideal idílico das
relações humanas e das discussões: partilhar uma mesma boa vontade de
saber, ter uma mesma temeridade para abraçar tudo o que se possa saber
de uma questão, estar convencidos de um modo semelhante que a
ignorância e a falta de curiosidade são coisas más, que o erro acabará por
ceder perante a verdade, partilhar a mesma convicção de que o saber
contribui para a nossa felicidade, mesmo que a Igreja tenha advertido:
‘Quem aumenta o seu saber, aumenta o seu sofrimento’» (Angenot, 2008:
146).
De entre as regras da argumentação, ou seja, aquelas que supostamente
permitem proceder à sua avaliação, podem apontar-se as seguintes:
1) Validade: produzir argumentos racionais.
2) A regra da pertinência, ou seja, discutir sobre o essencial e deixar de
lado o acidental.
3) Regra da refutabilidade, ou seja, a abertura à contestação dos
argumentos apresentados.
4) Regra da coerência e da não contradição.
Mas, também estas regras são critérios vagos e muito variáveis e surgem,
antes de mais, como formas de contra-argumentar. Na realidade, e no que
diz respeito às regras da argumentação, as palavras de Johnstone Jr.
parecem aqui mais acertadas ao dizer que a interação argumentativa
«mais do que ser governada por regras fixas, representa o esforço de, na
disputa, cada um reforçar as suas próprias regras. A legitimidade ou
relevância de um dado ponto estabelecido no curso da argumentação
depende das respectivas visões dos que estão envolvidos na
argumentação e a energia de cada argumentador está essencialmente
concentrada na tentativa de estabelecer as suas próprias visões»
(Johnstone Jr., 1959: 12), ideias que têm eco na advertência de Natanson
quando afirma que «o mais frequente é que o desacordo não seja uma
disputa em torno de certas proposições, mas uma disparidade estilística. O
desacordo é um modo de descobrir o estilo de espírito do interlocutor, de
reconhecer a geografia do seu mundo» (1965: 18-19).
Será então que não há regras para avaliar as argumentações? Voltamos a
uma passagem já citada de Plantin (2009b): «a prática da avaliação dos
argumentos é guiada por um princípio simples:
aquele que não admite
um discurso é o primeiro, porventura o melhor crítico
e, antes de
mais, ele fala; é pois preciso considerar a sua palavra. Esta última
afirmação é um princípio normativo que diz respeito não à atividade
argumentativa, mas ao método em teoria de argumentação. A tarefa desta
teoria é a de
inteirar-se o melhor possível desta atividade crítica e, não,
substituí-la. A conclusão inspirar-se-á em Guzot: laissez faire, laissez
aller —
e deixem dizer! Não existe um super-avaliador capaz de parar o
processo crítico por uma avaliação terminal que a todos faria calar. E,
quanto mais avaliações houver, mais argumentações apaixonantes haverá
para descrever».


Rui Alexandre Grácio
 
VocAbulário
 
© Rui GrÁcio 2015